Este ouvindo da turba as prosas frias, « Debalde, diz, o povo vil, perverso, « Co'as sonoras palavras Pindo, e Plectro, Ponho em meus versos locução divina; E sei, para cumprir as leis do metro, Quanto a historia das fabulas me ensina; Sei que dos ceos tem Jupiter o sceptro, Que nos infernos reina Proserpina; A madrugada sempre chamo aurora, Sempre chamo a um jasmim mimo de Flora. << Sei de certo em que tempo viu o mundo Filhos da terra os quatro irmãos gigantes; Sei finalmente conhecer a fundo O que são consoantes, ou toantes; «Fazel-as eu, não posso, nem desejo, As taes poesias, que a entender não chego, Podres palavras tem desenterrado; Se levam nó, é tão occulto e cego, Que quem quer desatal-o, váe logrado; Dizem que imitam n'isto um certo grego, Gloria de Thebas, Pindaro chamado; Se isto é assim, a sua lingua de ouro Seria grega, mas fallava mouro. <«< Quatro rapazes estendendo o panno, E umas taes linguas, a que chamam mortas, « Diz um sabio que o seculo presente la emendando os erros do passado; Mas que das odes a infeliz torrente Tinha a lingua outra vez estropeado; Que amontoam com mão impertinente, Quantas palavras velhas tem achado; Que se envergonham das que usamos todos, E vão buscal-as muito além dos godos. «Como a caruncho e podridão condemna A lição affectada dos antigos, Não leio Barros, Sousa, nem Lucena, « Não podem crer os genios lusitanos, Que as modas, como as vidas, são pequenas; Que já murchou esse estro dos romanos, E influem sobre nós outras Camenas; Que o tempò tragador, volvendo os annos, Fez cair Roma, fez cair Athenas; Que jaz no pó a Iliada envolvida, E que alça a frente a Phenix Renascida. » « Mais ia por diante o monstro horrendo C'o sermão, que ninguem lhe encommendára; Mas inimiga mão lhe foi batendo C'um baralho de cartas pela cara; Era um ponto infeliz, que estando ardendo, No innocente poeta se vingára; Que não sentiu o ver-se maltratado, Mas ter a porcos perolas lançado. Eis que o dono da casa espavorido, Vem com as mãos na cabeça: «Estou perdido, |